Filósofo italiano com cinco livros lançados em português, mas ainda pouco conhecido em terra brasilis. As duas resenhas – a cargo de Pedro Duarte de Andrade e Alberto Pucheu – celebram o lançamento de Profanações (Boitempo) e A Linguagem e a Morte (pela atentíssima editora da UFMG). Os livros já publicados no Brasil anteriormente, Estado de exceção, Homo Sacer eInfância e História, são até mais capitais para o pensamento de Agamben mas -- é claro -- são de se saudar os lançamentos recentes. Infelizmente, as resenhas de Andrade e Pucheu são úteis para quem já leu Agamben, mas não muito amigáveis para quem nunca o leu – contextualizam-no muito pouco. Em todo caso, para os que acompanham o pensamento italiano contemporâno, cabem duas observações sobre Agamben:
1. Ele tem pouquíssima – se é que tem – relação com o chamado pensiero debole, o “pensamento frágil” associado a Gianni Vatimo, que celebra, de alguma forma, a queda dos universais como “pátria” e “Deus” e tenta armar, a partir daí, uma ética da precariedade. Não é essa a turma de Agamben.
2. Tem ele também pouquíssimo que ver com o marxismo obreirista italiano de figuras como Toni Negri que, a partir de uma leitura eufórica da globalização, enxergam o novo comunismo nos lugares mais insólitos, até no Bolsa Família de Lula.
Agamben é um pensador que propõe menos saídas, celebra menos, indica menos caminhos. Arrasta-se no pensar com um pouco menos de pressa. Meu livro favorito de Agamben é O que resta de Auschwitz: A Testemunha e o Arquivo (ainda inédito em português, acho), onde encontramos frases como :
a notícia atroz que os sobreviventes carregam dos campos para a terra dos seres humanos é precisamente a de que é possível perder a dignidade e a decência para além da imaginação, de que ainda há vida na degradação mais extrema. E que esse saber agora se torna a pedra de toque pela qual se medirá e se julgará toda moral e toda dignidade.
Capital mesmo para o pensamento de Agamben é a definição de Carl Schmitt (sim, o conservadoríssimo e católico jurista alemão) do soberano como aquele decide sobre o estado de exceção . O conceito de estado de exceção tornar-se-ia chave para Agamben e inspiraria um belo livro, dedicado a pensar o problema da exceção (à lei, especialmente) no mundo pós 9/11 e pós-bombardeio ao Afeganistão. O vetusto debate entre as correntes jusnaturalistas e positivas do direito é revisitado por Agamben em outro livro elegantíssimo, Meios sem fim (Mezza senza fine, de 1996, que eu saiba ainda inédito no Brasil), onde ele revira de ponta a cabeça o debate jurídico sobre meios e fins.
Mas os conceitos pelos quais Agamben é mais conhecido são os de homo sacer e de vida nua, noções que ganharam ainda mais relevância depois da instalação dos campos de tortura em Guantánamo: com homo sacerAgamben nomeia aquele humano no limite do animal, aquele humano cuja morte não tem epitáfio e cuja existência é completamente descartável. Com vida nua ele designa esse estado de vida / morte, próprio a esses humanos: árabes torturados em Guatánamo e palestinos mortos sem epitáfios hoje, vítimas do regime do apartheid na África do Sul de uns poucos anos atrás. Figuras cuja proliferação diz algo, argumenta Agamben, sobre o mundo contemporâneo.
a maioria dos livros de Agamben estão em italiano e inglês ,mas os importantes livros Homo Sacer e Estado de exceção estão disponíveis aí no Brasil, em boas traduções. Com certeza vale a conferida, mesmo para quem não é leitor costumeiro de filosofia.
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